28/01/2012

Anatomia de um beijo

“…coloco um beijo na palma da minha mão e olho-o para o estudar, para o entender, para saber algo mais sobre ele… a sensação é apenas de toque suave dos meus lábios na palma da minha mão… nada mais retenho que o saber que senti a minha pele tocada pela minha própria boca… preciso saber mais sobre o beijo… examinar minuciosamente de forma a sentir o beijo como algo físico, palpável, real… então, aproximo-me de ti e olho-te nos olhos, nesses olhos que brilham dentro de mim como se tu não estivesses ali mas aqui, como se tu fosses parte do meu ser… toco-te com as minhas mãos nos teus ombros e dou um passo em direcção a ti… tua face serena, abre-se num sorriso… levo a minha mão aos teus cabelos e acaricio-os deslizando na seda dos mesmos… os nossos corpos encostam-se ao de leve num toque global presente sem ausência de sentidos, bem pelo contrário, com os sentidos todos em alerta… olho a tua boca entreaberta nesse sorriso que me encanta e seduz… és luz… és sol… és brilho em meu redor… humedeço meus lábios e aproximo-me lentamente da tua face… toco com eles ao de leve na pele que reluz perante o meu olhar… sinto o sal… um sabor leve a mar… os meus lábios tocam as tuas pálpebras fechadas para receber o meu beijo… sinto um suave sentir, um sorrir no olhar como se de outra boca se tratasse… retiro a minha boca e olho-te de novo… preciso saber o porquê do beijo saber a tudo o que tu és, numa dimensão de ser paz, doçura, mel e mar… vejo-te humedeceres os teus lábios e muito suavemente toco-os com os meus… mantenho a minha boca ao de leve no teu lábio superior e de seguida saboreio o teu lábio inferior… e sinto amor…sinto que preciso de sentir mais, de saber mais e melhor o porquê da paixão… é nesse momento que toco em completo a tua boca e saboreio o mel que tal sensação me transmite… as línguas tocam-se ao de leve para em seguida se fundirem num só beijo, num só toque… já não são duas bocas que se beijam pois é apenas o beijo em si mesmo que ali se encontra, se forma, se transmuta, se torna ávido e sereno ao mesmo tempo… mantemos o sentir tais sentidos, leves, lábios mordidos, línguas entrelaçadas e o sabor doce penetrar em permuta o âmago daquela sensual luta de pele com pele, de alma com alma, de corpo com corpo… e a paixão nasce daí e cresce em mim como em ti… saboreamos o momento… entramos em transe e deixamos de ser quem somos… e o beijo perdura num planar de doçura… e o beijo se torna dono de nós num galopar de sensações plenas, profundas mas de tal forma suaves e serenas que o beijo deixa de ser beijo para passar a ser desejo…”

15/01/2012

Basta

...eu tinha qualquer coisa para te dizer, algo que já anda dentro de mim há milhares de anos e nunca tive essa oportunidade...

...há dias, quando surgiste na minha vida, um pouco alheada do próprio mundo, quando ali surgiste espelhada na minha alma, eu estive quase quase para te dizer...

...penso que me faltou a coragem e a voz se me embargou; calei dentro de mim o que deveria ter gritado; talvez tenha esquecido a forma de gritar, talvez só saiba calar... não sei... já não sei...

...mas eu tinha qualquer coisa para te dizer, algo que me possui e me rasga a mente, num acto demente do meu próprio ser de aqui estar sem saber falar, sem saber o que te dizer, sem saber gritar o que tanto tenho calado... milhares de anos de silêncio dentro de mim...

...milhares de anos de solidão da minha própria voz; milhares de anos de espera que surjas ali à esquina, em qualquer lugar, e num momento de paz eu te possa gritar todo o meu amor...

...áhh dor que dói e me corrói a alma de tanto calar esta tão louca forma de te amar... dor de aqui estar e não saber o que te dizer, de não saber traduzir esta minha forma de tão somente te sorrir...

...e sorrio-te a todo o instante, aqui, ali, em qualquer lugar ainda que distante... não me preocupa se me ouves, se escondes as palavras que tão docemente me são devolvidas porque não enviadas; doces palavras de paz, ternura, carinho, amor... em doses de candura mas eivadas de toda a minha dor...

...estão aqui mas sei que tinha qualquer coisa para te dizer; como posso gritar se a voz se me tolda em silêncios ocos e sem eco ou se com eco ecoam apenas dentro do meu vazio, um vazio que não preencho ou se preencho apenas o preencho com a minha própria alma já de si tão gasta por durante todos estes milhares anos não me teres dito: Basta!...

10/01/2012

Sinto

Sinto que não sinto o que queria sentir; não sei se o que sinto é ou não o sentir do que sinto que não sinto sentir-se dentro de mim; desespero na angústia angustiada de me ver assim, nú, despido do nada, vestido numa pele cansada que cobre um corpo cálido mas tremente não de frio mas de quente; de um calor sem dor mas abrasador. E é este frio que me aquece num conforto dolente que me adormece neste deambular lento que até parece que fenece como flor varrida ao vento que não se esquece. Sinto que minto a mim mesmo na procura de não sentir o que sinto e não queria sentir. Vomito então o que quero esquecer mas sufoco no próprio vómito. Desejo indómito que não pára nunca de me dominar. Onde estás força de vontade de gritar? Onde estás prece urgente de abalar? Onde estás desejo prenhe de tortura? Já não sinto. Tenho de ir. Preciso dormir.

05/01/2012

Toque

"... deito a cabeça no teu regaço... olho-te a face serena... e teus lábios sorriem... tuas mãos se envolvem nos meus cabelos e a massagem leva-me ao sonho... fecho os olhos e deixo-me vogar no teu corpo... dentro de ti... à tua volta... mesmo sem te tocar te sinto... tuas mãos tocam o meu ser como se nos meus lábios estivesse todo eu, como se a minha boca fosse todo o meu corpo... teus dedos leves e suaves me transportam, nesse toque, para lá de mim mesmo e me deixo ficar por momentos apenas nesse espaço, nesse limbo, nesse suave sentir de seda e com sede de um beijo... é esse beijo que acontece a seguir... é esse toque que me faz emergir de mim para imergir-me em ti... apenas um leve sabor a pétala duma qualquer flor... apenas um leve sabor e tudo o que nos rodeia a seguir é tão-somente o amor..."